A Jesus Cristo Nosso Senhor - Gregório de Matos

Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado,
Da vossa alta piedade me despido;
Antes, quanto mais tenho delinqüido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.

Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.


Se uma ovelha perdida já cobrada,
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na Sacra História:


Eu sou, Senhor, ovelha desgarrada,
Cobrai-a; e não queirais, Pastor Divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória


*-*

      Gregório de Matos, poeta e advogado, escrevia poesias críticas sobre a igreja católica. Apesar de não ser padre, ele tinha um cargo de confiança dentro da Igreja, convívio que acabou por influenciar em seus escritos poéticos.
      Em um de seus poemas, “A Jesus Cristo Nosso Senhor”, ele dá ênfase à questão do pecado e do perdão, tema que é uma das marcas mais fortes da Igreja.
      O poeta escreve de maneira argumentativa, de forma que, ao mesmo tempo em que se assume pecador, cobra o perdão (clemência) de um Deus misericordioso, algo percebido já na primeira estrofe quando ele escreve: “Pequei, Senhor” e “Da Vossa alta clemência me despido”.
      O restante do poema segue da mesma forma, ou seja, apresenta-nos o pecador que cobra o perdão através do arrependimento, conforme pode ser visto na segunda estrofe, exposto na antítese entre o pecado e o perdão: “Que a mesma culpa que Vos há ofendido”, "Vos tem para o perdão lisonjeado”.
      O poeta termina o poema (na quarta estrofe) assumindo uma postura humilde em relação ao Criador, quando se apresenta como uma “ovelha desgarrada”. Mas, a despeito disso, simultaneamente, assume um tom ameaçador, uma vez que coloca sob inteira responsabilidade do Senhor a salvação da sua ovelha e não no arrependimento que ela possa um dia vir a sentir a respeito dos seus pecados.
      Gregório de Matos teve ainda outros escritos sobre a Igreja nos quais enfatizava sempre a dualidade pecado/perdão. Por fazer parte da classe literária Barroca, seus poemas eram conceptistas, pois visavam o significado da palavra e as agudezas ou sutilizas do pensamento, além de terem um misticismo ideológico (“O Barroco: Espírito e Estilo”).
      Nesse sentido, vale destacar que a antítese barroca se centraliza na vida e morte, uma temática forte que acabou por influenciar o eu lírico do poeta, já que em seus poemas sacros (ele escreveu outros que não falavam sobre a Igreja) ele assume uma postura humilde (de pecador) diante de uma força maior e invisível.


Leila

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